sábado, 11 de dezembro de 2010

Bourdieu e Marx. Antagônicos?

Na obra “A Produção da Crença”, Pierre Bourdieu busca a construção de uma economia para os bens simbólicos. Assim, poderia se dizer que o autor estaria buscando explicações imateriais, dando atenção apenas à subjetividade. No entanto, a leitura que faço da obra é de um debate direto com o materialismo e uma grande referência em Marx, tendo em vista que a leitura do texto nos remete a uma série de conceitos elaborados por este último.
O livro já inicia nos situando neste debate. Para entender a formação da mercadoria nos domínios (ou campos, utilizando o conceito do autor) da arte, Bourdieu começa por questionar a teoria do valor de Marx, em especial o valor de troca. Para ele, o valor de uma obra de arte não está ligar a quantidade de trabalho despendida na produção. Assim sendo, o valor de uma pintura não se resume ao tempo despendido pelo pintor na conclusão de sua obra, mas sim revela-se na “autoridade” acumulada por aquele pintor, marca, marchand, etc.
A autoridade se faz , na própria referência de valores acumulados naquele coletivo. Assim, uma obra de arte deve responder a anseios anteriores a ela, deve ter referência naquele imaginário previamente construído e, através disso, ganhar espaço na luta pela concorrência. Ou seja, dentro de um campo, os diversos valores se contrapõem e disputam espaço, referenciando-o ou não.
Assim, o poder se coloca através da imposição dos valores de uma estrutura dominante. Ou seja, pode-se exercer domínio sobre o outro através da dominação cultural, valorativa, através do conhecimento, uma vez que é necessário assimilar determinados valores de uma estrutura dominante para ascender na luta constante daquele campo. Desta forma, Bourdieu não vê a questão do poder stritu sensu, mas nas suas mais diversas formas de manifestação. Ele trata de três frações da classe dominante, que seriam o campo do poder cultural, campo do poder político e o campo do poder econômico. A articulação destes três campos é a chave de sustentação de uma estrutura social.
Sobre a crença, Bourdieu a trata como o desconhecimento de um campo sobre ele próprio. Entendendo-o como uma síntese de valores agregados, o campo está em constante transformação e, a crença nada mais é que a negação deste processo histórico, é uma visão estagnada do campo instituída pelas estruturas dominantes deste.
Concluo dizendo que a utilização de Bourdieu como uma arma contra o marxismo é um falseamento do debate ou uma ignorância do debate filosófico de Marx, haja vista que há em Bourdieu a constante utilização da História como elemento de análise e a noção de síntese entre os fatores em questão. Ao mesmo tempo, entendendo o materialismo de Marx como a síntese de múltiplas determinações e a relação dialética entre infraestrutura e superestrutura, não há o que temer na contribuição do ponto de vista simbólico que nos traz Bourdieu.

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