segunda-feira, 28 de fevereiro de 2011

História e Hermenêutica. Um debate para as possibilidades da teoria da História no horizonte da historiografia contemporânea. (Parte 1).




Este é um artigo elaborado durante a minha graduação em história na UFRJ. Ele está muito resumido (o original tem 14 páginas) e dividido em duas partes. Para quem gosta de discutir questões da teoria do conhecimento ele pode servir de uma apresentação básica de autores da escola histórica alemã. Quem tiver interessado na versão integral, eu mando por email. Sinal Preto!





Por Lucas Machado

O historiador Jorn Rusen em seu livro Razão Histórica propõe fundamentar os princípios de uma Teoria da História que tem como proposta discutir condições de possibilidade da ciência histórica entendida a partir de uma consideração da relação que as pessoas em geral estabelecem com a História ao buscar se situar no tempo e buscar orientação de sentido para suas vidas, ponto de partida para qualquer elaboração de conhecimento com a história como referente, inclusive as pesquisas científicas. A abordagem de Rusen acerca da Teoria da História tem influência do importante filósofo Hans Georg Gadamer, que influenciou muito os debates da historiografia alemã com suas teses sobre a “teoria da experiência hermenêutica” (Gadamer, 1999. P. 400), que será discutida quanto ás relações estabelecidas entre o princípio hermeneutico e a compreensão da história. Enfim, serão abordadas as contribuições do historiador Heinhart Koselleck para a reflexão das condições de possibilidade da História, através da “Histórica”, e suas reflexão sobre uma teoria da História que englobando a dimensão da compreensão hermenêutica, a ultrapassa quanto ao referente de seu campo de análise e construção do objeto do conhecimento. Rusen propõe entender o coditiano do historiador e a relação que as pessoas estabelecem entre a história e suas vidas como o ponto de partida que motiva os historiadores a elaborarem um conhecimento que, dando sentido ao passado, ordenam as experiências e expectativas quanto ao presente e ao futuro. A reflexão parte portanto da consciência histórica enquanto orientação no mundo. O interesse das pessoas pela história se dá por carências de orientação, carências em se situar no tempo, atribuir sentido ao passado e orientar a ação no mundo, projetando expectativas quanto ao futuro.
 A partir desses interesses ou carências, aspecto comum da consciência histórica dos indivíduos, Rusen descreve a elaboração do conhecimento histórico e seus procedimentos científicos, epistemológicos, metodológicos, a elaboração de formas narrativas de apresentação, que produzem um conhecimento que por sua vez agem ou influenciam a elaboração da consciência histórica de uma sociedade, retroalimentando os horizontes de expectativas, e gerando novas perguntas, novas carências, que por sua vez, dão impulso á elaboração de novas pesquisas. Este processo cíclico expressa uma cena em que a consciência histórica e as carências de orientação no tempo aparecem como ponto de partida e objetivo que alimenta a formação de respostas que geram novas perguntas, tem o mérito de pensar ateoria da história como uma reflexão meta-histórica e meta-teórica acerca da elaboração do conhecimento histórico em sua relação com a vida, ou seja, busca refletir sobre a questão fundamental de qual é a função social da história enquanto disciplina acadêmica, científica, especializada, qual a relação entre as motivações das pesquisas dos historiadores e, podemos dizer, o lugar social do qual o Historiador elabora o conhecimento a se alimenta de perguntas que ensejam respostas, e a capacidade deste tipo específico de conhecimento em retroalimentar a consciência histórica de uma sociedade determinada.
Este processo cíclico pode-se dizer, têm uma validade pertinente enquanto modelo para apresentar um quadro da influência da produção de conhecimento dos historiadores em sociedades aonde este tipo específico de conhecimento é efetivamente buscado enquanto conhecimento orientador de sentido no tempo, ou seja, não pode ser considerado um modelo “universal”, aplicável em qualquer país, principalmente em países aonde a produção especializada de conhecimento cria mais diálogo entre os historiadores entre si, que entre estes e a população em geral. Rusen apresenta este processo cíclico como “a interdependência dos cinco fatores pensamento histórico” (Rusen, Razão Histórica. P. 35). Parte da vida prática, os interesses que influem na formulação de idéias ou hipóteses que orientam uma perspectiva da experiência do passado, a formulação de hipóteses de pesquisa, que através da adoção de[1] procedimentos protocolares e metodológicos aceitos pela comunidade acadêmica formam as regras da pesquisa científica. A pesquisa é apresentada de forma particular através da elaboração de formas narrativas que, potencialmente, criam o diálogo com leitores cumprindo sua função de orientação existencial, quinto elemento da onde parte-se para a busca por novas orientações de sentido e novas formulações. Estes cinco fatores compõem, segundo Rusen, a “matriz disciplinar” da história, ela permite entender as atribuições elementares da ciência histórica e sua relação com a possibilidade de contribuição para a mudança da vida prática dos homens. O conceito de matriz disciplinar permite pensar a história como “dependente do contexto prático da vida dos historiadores e do público interessado em história”, e também “os interesses constitutivos do pensamento histórico como carências interpretadas de orientação no tempo” (Rusen, Idem). Estas carências não constituem as atribuições internas, próprias à ciência da história: “para o caráter científico do pensamento histórico são os métodos, como métodos da pesquisa científica”. A abordagem da matriz disciplinar permite, portanto discutir a teoria da história para alem da aplicação de métodos protocolares á empiria de forma a ordenar a pesquisa científica, ela relaciona a mudança das abordagens metodológicas com a vida social em sentido mais amplo.
A Razão Histórica de Rusen tem o sentido de uma razão comunicativa. Basear o fundamento da ciência histórica na razão significa considerar a ação dos homens no mundo enquanto eminentemente teleológica, ou seja, ela busca meios para atingir fins. Fundamentar o conhecimento histórico no agir racional significa reconhecer o caráter de atribuidor de sentido do conhecimento histórico. Esta razão tem o sentido de uma razão prática, que difere da razão cartesiana baseada em princípios universais. Ela inside sobre o reconhecimento de que o debate racional, a argumentação e o diálogo intersubjetivo com base em critérios reconhecidos consensualmente permitem um aperfeiçoamento qualitativo das pesquisas históricas, e fundamenta a busca por entender o sentido das mudanças protocolares da ciência histórica.
Além destas questões citadas, Rusen propõe abordar o significado da teoria da história para três questões: a pesquisa histórica; a historiografia; a formação histórica. Em relação á pesquisa histórica, a contribuição da teoria da história está na consideração crítica acerca das mudanças da matriz disciplinar mediante o debate, a comunicação argumentativa. A contribuição da teoria da história para a historiografia está em considerar criticamente as formas narrativas de apresentação de forma a que os resultados da pesquisa não tenham uma “perda”, em termo de racionalidade histórica em relação ao uso das formas de apresentação. A questão da formação histórica amplia o debate das formas de apresentação das pesquisas para o ensino escolar. De acordo com Rusen, a história enquanto disciplina escolar possui “teorias de aprendizado histórico” que devem ser consideradas de forma distinta da matriz disciplinar da história enquanto investigação científica. A “cientifização” da história impede o diálogo do conhecimento produzido nas pesquisas ser compreendido por estudantes escolares ou pessoas comuns, não especialistas. A teoria da história tem neste sentido o objetivo de problematizar a necessidade de didatização dos conhecimentos produzidos pela pesquisa histórica, levando em consideração a questão central de relacionar o conhecimento histórico com a vida prática de onde surgem originalmente as perguntas dos historiadores.



[1]  A reflexão de Jorn Rusen acerca das carências de orientação no tempo parece convergir emseus aspectos principais com a proposta de Heinhart Koselleck de pensar a relação do individuo com o tempo a partir dos conceitos de “Espaço de Experiências e Horizonte de Expectativas” (Koselleck, Futuro Passado. RJ, 2006).

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