quarta-feira, 13 de abril de 2011

Anti-anti-evolucionismo

Este subtítulo, obviamente, faz uma referência ao texto “Anti-anti-relativismo” de Clifford Geertz. Nele o autor explica sua intenção, que não é o retorno ao relativismo, mas a forma como se construía a crítica a ele. Da mesma forma, eu não pretendo um retorno ao evolucionismo, e inclusive, compartilho das críticas feitas a ele. No entanto, a forma como se construiu a sua oposição também trouxe “malefícios” para a compreensão científica.
No processo de construção da crítica ao evolucionismo, surgiu uma tradição na Antropologia de negar a História como elemento de análise. Assim foram produzidos grandes reducionismos, em rotular qualquer ramo do conhecimento que o fizesse como evolucionista. Isto tem fortes impactos na produção acadêmica até hoje.
Assim foi feito do marxismo. Apesar de – como teoria da práxis- projetar o socialismo como possibilidade de solução para as contradições do capitalismo, Marx não opera de forma teleológica, justamente pela visão dialética, onde não cabe uma relação de causa e conseqüência, mas a compreensão dos diferentes aspectos das contradições. Entendê-lo de outra forma seria aplicar uma visão hegeliana a Marx.
Marshall Sahlins é o antropólogo responsável pela “recuperação” da História como aspecto importante da análise científica. Através de seu livro “Ilhas de História”, pode-se entender a cultura não mais como algo estático, fechado em suas estruturas, mas dinâmico e em desenvolvimento contínuo. Ao analisar o contato dos chefes havaianos com os europeus, Sahlins mostra como a cultura ganha novos contornos com a chegada do estrangeiro, ou seja, a partir de um evento histórico:
Essa colisão de havaianos não é somente um paradigma, mas também resume uma possível teoria da história, da relação entre estrutura e evento (...)As formas específicas do contato europeu deram origem a formas de oposição entre chefias e pessoas comuns que não estavam previstas nas relações tradicionais entre elas.(...) Os significados culturais, carregados pelo mundo, são assim alterados. Segue-se então que, se as relações entre as categorias mudam, a estrutura é transformada.
Manuela Carneiro, explicando o que ela chama de “cultura entre aspas”, ou seja, a cultura auto-representada,demonstra também uma noção historicizada também do desenvolvimento da cultura. Segundo ela, a cultura, quando proclamada pelo próprio membro de sua sociedade, ou seja, enquanto forma “consciente”, perde em seu conteúdo, torna-se artificial, possivelmente por não compreender o processo histórico a qual está submetida.
No campo sociológico, Pierre Bourdieu, em “A Produção da Crença”, emite noção semelhante, nos termos que lhe são próprios. Na sua interpretação da sociedade dividida em “campos”, Bourdieu estabelece que cada campo compreende uma estrutura de significados e valores. Estes valores são construídos na luta por afirmação e na competição interiores ao campo. Assim, os valores do campo estão sempre em construção, se afirmando, se negando e reconstruindo, o que também remete a uma noção de processo histórico. Enquanto a “crença” é a forma estática que se dá aos valores do campo, aparecendo também como uma distorção da realidade.
Disso tudo se pode extrair que o resgate da História como elemento de análise dá atualidade também à teoria marxista. A interpretação dialética sob a luz do processo histórico pode dar novo tom ao conceito de cultura e à compreensão simbólica das formações sociais.

2 comentários:

  1. Muito bom Allysson!! Sobre a relação do marxismo com o debate sobre a cultura, o livro "Marxismo e filosofia da linguagem" de Mikhail Bactin (não sei se o nome tá correto) também seencontra como uma referencia importante para este debate.
    Lucas Santos.

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  2. Excelente Allysson! Foi no ponto exato. Abraços

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